Imagine a seguinte situação:
Você recentemente se matriculou em uma academia e está prestes a iniciar um novo projeto em sua vida para ser mais saudável, decide então ir ao shopping um dia antes para comprar alguns itens e assim começar sua jornada fitness.
Você entra em uma loja de materiais esportivos no shopping, vê uma garrafa d’água que custa R$20. Pega o objeto e fala: “Vou levar, é exatamente isso que eu estava procurando!” Uma pessoa para ao seu lado, te cutuca e diz: “Em outra loja a 300 metros daqui vi essa mesma garrafa por R$15”.
Você iria até a outra loja para comprar a garrafa d’água?
Agora suponha que em outra loja nesse mesmo shopping você encontre um tênis para corrida de uma marca famosa, ideal para correr na esteira e eliminar de vez os quilos extras que tanto te incomodam. O tênis, no entanto, custa R$400. A mesma pessoa da primeira loja entra e te avisa que em outro estabelecimento a alguns minutos de lá o mesmo produto está custando R$395.
Você iria até a outra loja para comprar o tênis?
É muito provável que você responda sim para a primeira questão e não para a segunda, esse é o comportamento previsível e um tanto quanto irracional (do ponto de vista econômico) que experimentos semelhantes realizados por Economistas Comportamentais mostraram. O valor do desconto nos dois casos é o mesmo (R$5), porém, o que foi percebido é que o impacto dos descontos quando os preços são menores é maior do que em valores mais altos.
Pressuposto da Racionalidade Econômica
O fato é que nós formulamos nossas decisões financeiras de maneira diferente do que é descrito pela Teoria Econômica Tradicional. Um dos principais pressupostos da economia tradicional é que somos agentes racionais e estamos sempre em busca de maximizar nossos lucros e minimizar nossos prejuízos, isso funciona como se a gente processasse de forma matemática todas as informações disponíveis para fazer nossas escolhas.
Porém, não tomamos nossas decisões em um vácuo, as tomamos em um ambiente onde diversos acontecimentos previsíveis ou não ocorrem. Nossas escolhas também não são o tempo todo pautadas em raciocínios lógicos. Segundo a psicóloga e economista Sheena Iyengar em um estudo da Universidade de Columbia, tomamos em média 70 decisões em um dia comum, desde a hora que acordamos até a hora de dormir, claro que esse número varia, para um CEO de uma empresa, por exemplo, esse o número é bem maior.
Só que a gente sabe que para a maior parte dessas decisões não temos tanto tempo à disposição assim para fazer a ponderação de prós e contras e avaliar qual a melhor opção para nós. Na verdade, para a maior parte das nossas decisões temos somente alguns minutos disponíveis e às vezes até muita pressão. Por isso usamos mecanismos associativos nessas horas, como as heurísticas que falamos brevemente no texto de aversão à perda.
É verdade que levamos muito mais em consideração também nossas emoções e experiências passadas ao fazer uma escolha, isso muitas vezes pode impactar o nosso comportamento econômico. E é justamente essa percepção do componente psicológico nas decisões financeiras que vem chamando a atenção de tantos estudiosos nos últimos anos.
Contabilidade Mental
A teoria da Contabilidade Mental foi desenvolvida por Richard Thaler, prêmio Nobel em Economia no ano passado por seus estudos na área. Thaler a define como “um conjunto de operações cognitivas usadas por indivíduos e famílias para organizar, avaliar e manter o controle de suas atividades financeiras”. A ideia central é exatamente essa que conversamos até aqui, como nossas emoções podem influenciar nossas escolhas financeiras.
Você com certeza tem um amigo que acha justo pagar R$ 200 para ir a uma festa, porém quando você conversa sobre um investimento que fez com esse mesmo valor, ele logo diz: “Não posso abrir mão desse dinheiro agora”. A contabilidade mental descreve justamente esse tipo de cenário, é muito comum encontrarmos pessoas com dívida no cheque especial, no qual pagam altíssimas taxas de juros, porém possuem um valor guardado com um rendimento bem abaixo dessa taxa. O que não faz muito sentido, já que você está perdendo dinheiro, mesmo tendo algum dinheiro disponível para quitar sua dívida.
O que ocorre é que separamos nosso orçamento em caixinhas diferentes, uma em cada setor. Achamos R$200 uma boa quantia para ser alocada em lazer, porém alta quando falamos em gastos com o nosso futuro. Inclusive, pensar no longo prazo é uma limitação que nós seres humanos temos em excesso. A área que é ativada em nosso cérebro quando poupamos dinheiro para nossa aposentadoria é a mesma quando doamos dinheiro para um estranho na rua, é como se o nosso “eu” do amanhã fosse para nós uma pessoa desconhecida.
Outro exemplo de como não percebemos o dinheiro de forma racional é o cartão de crédito. Pagar à vista é sempre mais doloroso do que pagar no crédito, ver aquelas notas saindo do seu bolso e indo para as mãos de outra pessoa, é como se passasse um pequeno filme em nossas cabeças sobre o quanto trabalhamos para juntarmos aquela quantia, todo o tempo que levou… Porém, no cartão tudo bem e se puder parcelar, melhor ainda, não é assim? O que eu vou falar com certeza não é nenhuma novidade, mas a quantia de dinheiro é a mesma e a fonte pagadora também é: você! Ter mais atenção a tais comportamentos pode mudar nossa vida financeira.
A contribuição de Richard Thaler para a ciência econômica é muito rica. Suas análises levam em consideração certos traços psicológicos que influenciam nas decisões econômicas como: a racionalidade limitada, compreensão sobre equidade e ausência de autocontrole. De acordo com a teoria da contabilidade mental, cada decisão financeira é avaliada de forma individual e temos a tendência de ignorar o impacto desta em nosso plano geral.
Esperamos que vocês tenham gostado do texto de hoje, tomara que ele provoque algumas reflexões e também os ajude a tomar melhores decisões. Se tiverem alguma dúvida ou quiserem compartilhar com a gente alguma experiência que já aconteceu com vocês e o artigo trouxe a lembrança, é só falar nos comentários.
Até a próxima!
Artigos que podem ser úteis para você: Aversão a perda do investidor | Orçamento Familiar: Como montar o seu?